Dom Gilvan
Francisco dos Santos, O.S.B
(Monge Beneditino)
Salvador, Bahia
– 16 de dezembro de 2023.
- O pecado sussurra ao ímpio lá no fundo do seu coração; o
temor do Senhor, nosso Deus, não existe perante seus olhos. Lisonjeia a si
mesmo pensando: “Ninguém vê nem condena o meu crime!” Traz na boca maldade e
engano; já não quer refletir e agir bem. Arquiteta a maldade em seu leito, nos
caminhos errados insiste e não quer afastar-se do mal. (Sl 35 (36),2-5). Saltério Monástico.
Cada cultura, cada povo, cada
religião, formaram o seu conceito sobre o pecado. Nisto está a sua grande
complexidade. As perguntas que fazemos e que constantemente ouvimos são estas: “O
que é o pecado?” ou “O que é pecado venial e pecado grave ou
mortal? O que caracteriza um pecado mortal? São perguntas importantes
e necessárias para a nossa vida cristã. Não só estas perguntas, mas tantas
outras nos aparecem diariamente. Quando converso com as pessoas sobre a questão
do pecado, sempre deixo um questionamento para as mesmas sobre a natureza desse
conceito tão falado e propagado, porém pouco conhecido. Principalmente nos dias
atuais em que a forma e a questão de pecado mudaram drasticamente, deixando as
pessoas iludidas e perdidas em seus pensamentos sem um conhecimento claro sobre
esse assunto. Portanto, um dos questionamentos que lanço é este: Pecar em
certas ocasiões nos deixam alegres; porque esse ato se configura em uma coisa
má? Assim, nos perguntando creio
que teremos um certo conhecimento da gravidade do ato que poderemos cometer em
nossa vida. Cuidado! Há certas ações perigosas e pecaminosas que nos deixam
quase em êxtase, no entanto, elas podem matar o nosso corpo e levar a nossa
alma para a perdição eterna. Exemplificando: a vingança, a gula, a luxúria e
tantos outros atos que aparentemente traz uma certa alegria quando são
praticados, porém, a curto ou longo prazo, trará para o praticante tristezas,
amarguras, mortes, etc. Ou seja, os efeitos da alegria do pecado não perduram
como os da virtude.
Pois bem, tão
sério é esse assunto, que diante de tais questionamentos, ficamos ainda um
tanto quase que perdidos nos nossos conceitos em relação a essas transgressões
leves, graves ou pesadas, como dizemos no nosso cotidiano.
Vamos
agora dar uma olhada em alguns conceitos básicos do Compêndio da Moral
Católica, o qual assim define esses atos cometidos pelos homens. Segundo ele, “O
pecado é a transgressão voluntária da lei divina. Como toda lei deriva da lei
divina, a transgressão de qualquer delas é pecado”. (Compêndio da Moral
Católica, 1943, n.96, p. 66).
Escutemos
com atenção mais uma vez o que nos ensina o mesmo Compêndio: “Para haver
pecado, requer-se: A) a transgressão de uma lei (ou ao menos do que se supõe
tal); B) o conhecimento ao menos vago, da transgressão; C) o livre
consentimento”. (CMC, n.96, p. 66). É bastante importante conhecer esses
conceitos porque se você conhece o básico do que seja um ato de pecado,
certamente você não cometerá tantos atos prejudiciais à sua vida e a dos
outros.
O
Catecismo da Igreja Católica também nos define o que é pecado quando nos diz: “O
pecado é uma falta contra a razão, a verdade, a consciência reta; é uma falta
ao amor verdadeiro para com Deus e para com o próximo, por causa de um apego
perverso a certos bens. Fere a natureza do homem e ofende a solidariedade
humana. Foi definido como "uma palavra, um ato ou um desejo contrários à
lei eterna". (n. 1849).
E segue
nos ensinando que: “O pecado é ofensa a Deus: "Pequei contra ti, contra
ti somente; pratiquei o que é mau aos teus olhos" (Sl 51,6). O pecado
ergue-se contra o amor de Deus por nós e desvia dele os nossos corações. Como o
primeiro pecado, é uma desobediência, uma revolta contra Deus, por vontade de
tornar-se "como deuses", conhecendo e determinando o bem e o mal (Gn
3,5). O pecado é, portanto, "amor de si mesmo até o desprezo de
Deus". Por essa exaltação orgulhosa de si, o pecado é diametralmente
contrário à obediência de Jesus, que realiza a salvação”. (n. 1850).
Segundo a
Teologia, certos pensamentos do homem configura-se como pecado e causam um
enorme impacto na nossa alma e na história da humanidade. Isso acontecem por
que o homem ao praticar tais pecados, mexem também com toda uma engrenagem
psicológica e social, não só da própria pessoa, mas também de todos que estão à
sua volta. Daí o grande cuidado que devemos ter em relação aos nossos atos. O
Compêndio ainda nos alerta: “Os atos humanos (actus humani) são os atos que
procedem do conhecimento e da livre vontade do homem”. (CMC, 1943, n.3, p.
18).
São Paulo
na sua carta aos Coríntios vai nos ensinar: “Eu não corro, não quem corre às
cegas; eu luto, não como quem fere o ar, mas castigo o meu corpo e o reduzo à
servidão”. (1Cor 9,26-27a). Ou seja, devemos ter o conhecimento dos
nossos atos e ficarmos atentos a eles. Porém, isso requer sacrifícios e a
maioria não querem ou não tem forças para sacrificar muitas das suas vontades e
fogem das suas responsabilidades cristãs, caindo assim em muitas transgressões.
Se somos
ou queremos ser bons cristãos, um meio bastante eficaz de fugir dos pecados é
olharmos para a vida de Jesus Cristo, primeiramente, da Virgem Maria, Mãe
Imaculada e da legião dos santos que seguiram a Cristo e conseguiram a coroa
eterna de glória.
A beleza da vida do cristão é a vida de Jesus, se
assim não for, e não vermos beleza nesse seguimento, seremos qualquer outra
coisa, menos cristãos verdadeiros. Que nós a vivamos com fé essa vida exemplar
do Senhor, pois tudo irradia dessa vida perfeita. Só Ele é verdade, caminho e
luz. Portanto, devemos ter cuidado
com a rotina da nossa vida para não perdermos o encanto e o gosto pelas ações
diárias. Procuremos viver bem o tempo presente, dádiva de Deus. A
Palavra não está longe de nós. (cf. Dt
30,11-20).
Se faz necessário diariamente, redescobrir Jesus: Como? Lendo as Escrituras com o coração e
sempre procurar um tempo para a oração. Quando fizermos isso, viveremos uma
vida evangélica e deixaremos as atitudes más, os pecados. Ruminemos bem a
Palavra de Deus. Reconhecer Jesus é sairmos do centro e nele colocar o Cristo.
A oração é outro meio de fugir ao pecado. Assim
Jesus nos alerta nas Escrituras: “Vigiai
e orai, para que não entreis em tentação, pois o espírito está pronto, mas a
carne é fraca”. (Mt 26,41). O
próprio Senhor estava ciente das nossas fraquezas humanas. Se caíres,
levante-se e reze.
Entraremos no mundo da Oração, pois é ela quem vai sempre
nos guiar na caminhada para o céu. O cristão que não tem uma vida de oração não
cumpre o preceito de Cristo. Jesus mesmo nos pede para rezar e nos dá exemplo
disso. Tantas vezes os Evangelistas nos mostra Jesus em oração.
“Pai,
chegou a hora: glorifica teu Filho, para que teu Filho te glorifique, e que,
pelo poder que lhe deste sobre toda carne, ele dê a vida eterna a todos os que
lhe deste! Ora, a vida eterna é esta: que eles te conheçam a ti, o único Deus
verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus Cristo. Eu te glorifiquei na terra,
conclui a obra que me encarregaste de realizar. E agora, glorifica-me, Pai,
junto de ti com a glória que eu tinha junto de ti antes que o mundo existisse.
Manifestei o teu nome aos homens que do mundo me deste”. (Jo 17,1-6).
Confiram inteiramente a belíssima oração sacerdotal
de Jesus, onde ele demonstra todo o seu amor por aqueles que lhe seguem. A
oração deve sempre está presente em todos os nossos empreendimentos, porque ela
nos prepara para enfrentar as dificuldades e evitar os pecados e os seus
encantos. Sabemos que sempre Jesus rezava antes de fazer um milagre ou quando ia
enfrentar seus opositores. Após essa oração sacerdotal de Jesus ele se dirigiu
para o Jardim das Oliveiras com seus discípulos, para sofrer a sua Paixão. (cf.
Jo 18,1-40; Jo 19,1-42).
O Catecismo da Igreja assim nos ensina: “Na tradição viva da oração, cada Igreja
propõe aos seus fiéis, segundo o contexto histórico, social e cultural, a
linguagem da sua oração: palavras, melodias, gestos e iconografia. Compete ao
Magistério ajuizar sobre a fidelidade destes caminhos de oração à Tradição da
fé apostólica. E aos pastores e catequistas incumbe a tarefa de explicar o seu
sentido, sempre com referência a Jesus Cristo. (CIC 2663).
Rezemos também uns pelos outros como nos ensina São
Timóteo na sua primeira carta o qual nos recomenda como devemos fazer a oração.
“Recomendo, pois, antes de tudo, que se
façam pedidos, orações, súplicas e ações de graças, por todos os homens ...”
(cf.1Tm 2,1-8).
O nosso
Patriarca São Bento de Núrsia (480-547), nos ensina: Levantemo-nos então
finalmente, pois a Escritura nos desperta dizendo: “Já é hora de nos
levantarmos do sono”. E, como os olhos abertos para a luz deífica, ouçamos,
ouvidos atentos, o que nos adverte a voz divina que clama todos os dias: Hoje,
se ouvirdes a sua voz, não permitais que se endureçam vossos corações”, e de
novo: “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça o que o Espírito diz às igrejas”. E
que diz? – vinde meus filhos, ouvi-me, eu vos ensinarei o temor do Senhor.
Correi enquanto tiverdes a luz da vida, para que as trevas da morte não vos
envolvam”. (RB Prólogo, 8-13).
Portanto,
tenhamos cuidado com os encantos do pecado. Por isso, São Bento nos diz no
capítulo quarto da Regra: “Não abraçar as delícias”. (RB 4,12). O
pecado possui um poder inebriante deixando as pessoas presas em seus laços.
Porém, saibamos que os seus efeitos prazerosos não perduram por muito tempo
como os efeitos das virtudes e do bem.
São Bento
nos mostra com veemência nessa passagem e em tantas outras da Regra para os
mosteiros o perigo dos pecados e as suas consequências em nossa vida. Aqui ele
nos ensina: “Assim, é-nos proibido fazer a própria vontade, visto que nos
diz a Escritura: “Afasta-te das tuas próprias vontades.” [...] “Há cominhos
considerados retos pelos homens cujo fim mergulha até no fundo o inferno” ...
(RB 7,19-30). Pois é! Há pecados muito prazerosos que inebria os homens
em forma de bem. CUIDADO!!
Permaneçamos em Jesus e caminhemos sempre ao seu lado, e jamais erraremos o caminho certo para Deus, pois ele nos diz: “Permanecei em mim e eu permanecerei em vós”. (Jo 15,4-17). “Quem permanece dá fruto de vida eterna”. (Jo 15,16). Isso é fugir do pecado e não cairmos nos seus encantos que levam a morte. Coloquemos sempre Jesus no centro de nossa vida.
TEXTOS
BÍBLICOS:
Sobre o pecado:
- Gn 3,6-20 – O encanto do pecado e a punição de
Deus ao homem.
- Sl 36,2-5 – O sussurro do pecado.
- 1Jo 1,7-9 – Andar na luz.
- 1Jo 3,4-6 – Transgressão. Quem conhece a Deus
não peca.
- Rm 5,12-15 – Adão e Jesus. O pecado entrou no
mundo por Adão e a remissão por Jesus Cristo.
- Rm 6,12-14 – Ir contra o pecado não se
sujeitando as suas paixões.
- Cl 3,5-17 – Preceitos gerais da vida cristã.
Ir contra o pecado.
- Gl 5,19-26 – As obras da carne e os frutos do
Espírito.
- 2Cor 5,21 – Cristo homem. Deus o fez pecado
por nossa causa.
- Tg 1,13-15 – Sobre a tentação – Deus não tenta
a ninguém. Cada qual é provado pela sua própria concupiscência que o arrasta e
seduz.
REFERÊNCIAS
BÍBLIA DE
JERUSALÉM. Nova edição, revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2002.
CATECISMO
DA IGREJA CATÓLICA. 3ª. ed. / Petrópolis: Vozes; São Paulo: Paulinas, Loyola,
Ave-Maria, 1993.
ENOUT,
Evangelista João. A Regra de São Bento. Latim-Português. Tradução D.
João Evangelista Enout, O.S.B; Rio de Janeiro: LUMEM CHRIST, 1992.
JONE-FOX,
Heriberto. Roberto. Compêndio da Moral Católica. Pe. Heriberto Jone O.M
Cap. / [traduzido da 10ª edição original e adaptado ao Código Civil Brasileiro
bem como às prescrições do Concílio Plenário pelo Pe. Roberto Fox SJ]. – Porto
Alegre: Edições A Nação, 1943.
RELATOS DE UM PEREGRINO RUSSO. Coleção: “A oração dos pobres” Edição Paulinas – São Paulo, 1985.
Ut In Omnibus Glorificetur Deus (RB 57, 9)
Nenhum comentário:
Postar um comentário