Dom Gilvan
Francisco dos Santos, O.S.B
(Monge Beneditino)
Salvador, Bahia
– 21 de outubro de 2017
INTRODUÇÃO
Falar
da Arquiabadia de Montecassino não é tarefa fácil, devido a sua grande
importância na vida da Igreja e na História Universal. Deixo esse encargo para
os historiadores. No entanto, dirijo aos meus leitores essas poucas linhas onde
desejo mostrar-lhes alguns pontos da história desta joia rara do cristianismo. Este
texto teve como iniciativa a curiosidade de alguns amigos que me pediam que
escrevesse algo sobre tão importante Mosteiro.
Uma
boa leitura a todos!
A ARQUIABADIA DE
MONTECASSINO, (529) ITÁLIA
A Abadia
de Montecassino é um Mosteiro de grande porte, tanto na sua arquitetura como na
sua história. Só pensando em seu fundador, Nosso Santo Patriarca São Bento, (480-547), faz-nos calar ante os
grandes feitos deste Venerável Pai. No entanto, descrevo aqui outros acontecimentos
que uma grande parte das pessoas não tem conhecimento, pelo menos é o que
observei nestes anos de vida monástica. Por exemplo, a escritura da Santa Regra, que nos traz uma síntese
perfeita do Evangelho (um escrito
cristocêntrico), Regra esta, que deu a Igreja de Jesus Cristo, mais de 20 Papas que viveram sob Regra de São_Bento. Regra que foi escrita por São
Bento neste Mosteiro de Montecassino. Também guiados pela mesma Regra temos
hoje mais de 5.000 (cinco mil) santos beneditinos canonizados que intercedem
por nós no céu.
Outra
parte da história foram os Abades deste Mosteiro que daí saíram eleitos Papas da
Santa Igreja. Foram eles: Rev.mo Abade
Frederico de Lorraine (1000-1058) mais tarde com o nome de Estêvão IX, O.S.B, 154º Papa (papado de
1057-1058), Abade de Montecassino e, o Rev.mo
Abade Desidério (1026-1087) mais tarde tornou-se Papa com o nome de
Vítor III, O.S.B, 158º Papa (papado de 1086-1087), também Abade de
Montecassino, o qual foi beatificado.
Podemos
ver também o envio de monges para outras
partes do mundo que até então não eram evangelizadas etc. Aos conhecedores
da História Universal, por esses fatos descritos aqui, dão-se eles, conta da
grandeza deste Mosteiro. Pois são inúmeros os acontecimentos ocorridos neste
lugar sagrado.
Pos bem!
Prosigamos na história desta magnífica Arquiabadia, uma verdadeira obra-prima do
monaquismo ocidental.
Montecassino
foi o segundo Mosteiro fundado por Nosso Pai São Bento, pois, o primeiro a ser
fundado foi o Mosteiro de Subiaco, Itália, onde o santo Pai iniciou a
sua vida de monge ajudado por São Romão, monge. A Abadia de Montecassino foi
fundada por volta do ano 529
d.C. Esta importante construção está situada acima do nível do mar a 517m.
Erguido "numa massa imponente na forma de um quadrilátero irregular que cobre
uma área de 200x100m" (MONTECASSINO, 2016).
O
Mosteiro está situado sobre os vetígios de uma fortificação romana do Município
de Cassinum. Nesse local havia um templo que era dedicado ao deus Apolo e perto
daí também existia um bosque sagrado onde fazia-se sacrifícios. Quanto a isso
deixemos o nosso grande Papa beneditino, São Gregório Magno, O.S.B, nos falar:
Cassino
fica situada na encosta de uma alta montanha, que quase abre seu seio para
acolher a cidadela e, três milhas acima, lança o seu cume em direção ao céu.
Naqueles tempos, erguia-se sobre o topo um antiquíssimo templo, no qual,
segundo os costumes dos antigos pagãos, os camponeses veneravam o deus Apolo.
Os bosques que cresciam ao redor eram consagrados aos demônios e, ainda nos
dias de Bento, uma multidão fanática de pagãos esforçava-se para oferecer
sacrifícios sacrílegos (Diálogos cap.
8, p. 41).
Mas o
grande Patriarca São Bento, vendo aquele grande mal, feito pelos espíritos
maus, às almas dos filhos do Deus Altíssimo, toma uma decisão digna de um homem
que é servo do mesmo Deus Todo-Poderoso. Ouçamos mais uma vez o grande Papa
Gregório:
Assim que o homem de Deus ali
chegou, reduziu o ídolo a pedaços, destruiu o altar, cortou os arbustos, ergueu
um oratório a São Martinho exatamente no lugar onde se erguia o templo de Apolo
e, onde havia o altar dos sacrifícios ao ídolo, construiu uma capela dedicada a
São João. Ao mesmo tempo, através de uma pregação contínua, exortava a fé o
povo que habitava nas redondezas (Diálogos cap. 8, p. 41).
A Abadia
está situada numa região estrategicamente fabulosa. Isto é, no topo de uma alta
montanha onde da imponente e esplendorosa construção, vislumbra-se todo o vale.
Ouso dizer que, esta, parece uma imperatriz no topo do monte, sentada em seu
majestoso trono, onde todos a olham com curiosidade e grande respeito, devido a
história do seu esplendoroso reinado, conquistado séculos afora. Tudo isso, é
claro, pelas virtudes do Nosso Santo Patriarca São Bento. Pois aí viveu e fez
sua Páscoa Eterna no dia 21 de março do ano de 547. Quanto a esse maravilhoso
fato narrado por São Gregório Magno em seus Diálogos, ouçamos:
No
mesmo ano em que devia deixar esta vida, pronunciou o dia exato da sua
santíssima morte a alguns dos discípulos que estavam com ele e a outros que
viviam distante. Ordenou aos presentes que não o revelassem a ninguém e indicou
aos que estavam ausentes qual seria o sinal que lhes avisaria o momento em que
a sua alma sairia do corpo. Seis dias antes de morrer, fez com que abrissem o
seu sepulcro. Foi então subitamente tomado por uma febre alta, que começou a
prostrá-lo implacavelmente. Como aquele mal o debilitava cada vez mais, no
sexto dia pediu aos discípulos que o levassem ao oratório, onde se fortificou
para a grande passagem com o viático do Corpo e Sangue de nosso Senhor. Os
monges seguravam-lhe os membros trêmulos e ele, com as mãos levantadas ao céu,
rezando em pé, deu o seu último suspiro. Naquele mesmo dia, dois de seus
discípulos, um que se encontrava no mosteiro e outro que estava num lugar mais
distante tiveram a mesma visão. Viram uma estrada toda coberta de tapetes,
resplandecendo à luz de inúmeros candeeiros e que, partindo de sua cela,
conduzia ao oriente, elevando-se em direção ao céu. No alto, ao fim da estrada,
estava um homem de aspecto venerável e radiante de luz, que que perguntou a
ambos para quem seria aquela estrada que olhavam. Eles responderam que não
sabiam. Então, o homem lhes disse: “Este é o caminho pelo qual Bento, amado
por Deus, subiu ao céu”. Assim como
os presentes, que viram a morte do santo, também os ausentes a puderam conhecer
através do sinal que lhes fora prenunciado. Foi sepultado no oratório de São
João Batista, que ele havia construído, após ter destruído o altar de Apolo (Diálogos cap. 37, p. 111).
Aí também
nesta Abadia repousa o corpo de Santa Escolástica sua querida irmã gêmea que
falecera pouco tempo antes do seu irmão Bento, no ano de 547, que segundo a
tradição esta sua Páscoa ocorreu no dia 10 de fevereiro. Sobre a morte de Santa
Escolástica São Gregório nos fala:
[…] o homem de Deus estava em sua
cela quando, ao erguer os olhos ao céu, viu a alma da irmã, saída do corpo,
penetrar nas profundezas do céu, sob a forma de pomba. Repleto de alegria pelo
triunfo da irmã, agradeceu a Deus todo-poderoso com hinos de louvor e deu a
notícia a seus monges, ou melhor, ordenou a alguns deles que pegassem o corpo
de Escolástica e o transportassem ao mosteiro, para que fossem enterrado na
sepultura que ele havia preparado para si (Diálogos cap. 34, p. 103).
Falar da
Abadia de Montecassino sem narrar estes dois episódios, ficaria um tanto a
desejar porque São Bento e Santa Escolástica a meu ver são os maiores tesouros
deste Mosteiro. E, a grandeza deste lugar, dar-se “graças a extraordinária vida do seu fundador e ao seu sepulcro aí
situado” (MONTECASSINO, 2016).
AS DESTRUIÇÕES DA ABADIA
Este
Mosteiro perdura pelos séculos afora na história da Igreja e do mundo com dias
de glória mas também de grande aflição para todos. Principalmente na últma
destruição no recente ano de 1944 na qual a Abadia sofreu perdas irreparáveis
no seu acervo artístico. E, no desenrrolar desta mesma história foi destruído
quatro vezes, mas, florescendo com um vigor ainda mais explendoroso. Por isso
seu lema: “Cortado floresce”.
A sua primeira
destruição deu-se cerca do ano de 577 pelos Lombardos de Zotone, Ducado
de Benevento. Esse fato triste da história do Mosteiro foi vista pelo Santo Pai
São Bento numa revelação do Deus onipotente. Escutemos o que nos fala São
Gregório Magno em relação a este acontecimento:
Um
nobre, chamado Teóprobo, chegou à vida monástica estimulado pelas exortações do
Pai Bento. Pela integridade de seus hábitos, gozava da confiança e da
proximidade do mestre. Um dia, ao entrar na cela do santo, Teóprobo notou que
este chorava. Em silêncio, esperou respeitosamente por um longo tempo, mas
visto que as lágrimas não cessavam e que o homem de Deus não chorava como de
costume, durante as suas orações, mas por está verdadeiramente desolado,
perguntou-lhe o motivo daquela grande dor. Bento logo respondeu: “Este mosteiro
que construí, assim como todas as coisas que preparei para os monges, está
destinado, por decisão de Deus onipotente, a cair nas mãos dos bárbaros.
Consegui apenas que seja poupada a vida dos monges, que daqui sairão incólumes”
(Diálogos cap. 17, p. 63).
Porém, no
início do “século VIII o Papa Gregório
II (669-731) comissionou Petronace de Brescia a reconstrução do mosteiro”.
(MONTECASSINO, 2016). Portanto, para a Abadia de Montecassino esse fato teve
grande importância porque com essa reconstrução ela teve seu esplendor marcado
neste século. E, assim, floresceu mas bela que antes. Por conta desta
reconstrução vieram a Abadia:
[…] o monge saxão Villibaldo, o
monge Sturmius discípulo de São Bonifácio, fundador de Fulda e do monasticismo
germânico, Gisulfo II Duque de Benavento, Carlomano irmão de Pipin, Ratchis rei
dos Lombardos, Anselmo futuro Abade de Nonantola. Em 787, Carlos Magno visitou
a Abadia e concedeu-lhe amplos privilégios. (MONTECASSINO, 2016).
A segunda
destruição de Montecassino ocorreu no ano de 883, pelos Sarracenos,
chegando estes a assassinar um santo e importante monge de nome Bertário.
Em 883, os Sarracenos invadiram o
Mosteiro, provocando a morte de Bretário, o monge santo e fundador de Cassino
Medieval. Os monges sobreviventes fugiram para Teano e mais tarde para Cápua. A
vida monástica só foi totalmente retomada em meados de século X, graças ao
Abade Aligerno (MONTECASSINO, 2016).
A terceira
destruição deste Arquicenóbio foi devido a um grande terremoto e, por
isso, a imponente Abadia desmoronou quase que totalmente no ano de 1349.
A terceira destruição foi
provocada por um terremoto em 1349. Só restaram algumas paredes do esplendoroso
edifício do Abade Desidério. Durante a reconstrução foram feitas muitas adições
e melhoramentos, e a Abadia cresceu em imponência (MONTECASSINO, 2016).
A quarta
e última destruição da Abadia, aconteceu devido a Segunda Grande Guerra
Mundial em que “Montecassino se viu na linha de fogo entre dois exércitos” a
qual foi bombardeada a 15 de fevereiro de 1944, pelo exército Norte-americano. Esta
foi a mais triste de todas, porque morreram muitas pessoas neste bombardeio. No
entanto, esta floresceu no seu antigo esplendor.
Este local de oração e estudo,
que nesta situação excesional se havia tornado um refúgio para centenas de
civis inocentes, no espaço de três horas foi reduzida a escombros, sob os quais
muitos refugiados encontraram a morte (MONTECASSINO, 2016).
Mesmo
assim, com a mais devastadora destruição, a magnífica Abadia não desapareceu da
história. Quem a visita tem o privilégio de vê-la majestosa como antes, devido
a força e determinação do seu grande Abade
o Rev.mo Dom Abade Ildefonso Rea, o reconstrutor. O qual no seu
programa de reconstrução afirmou que a queria: “onde e como estava”.
A Abadia foi reconstruída
seguindo o antigo traçado arquitetônico e o “onde e como estava” do
programa do Abade Ildefonso Rea, o reconstrutor. (MONTECASSINO, 2016).
A
reconstrução e redecoração de todo o edifício duraram mais de uma década, sendo
estes trabalhos financiados pelo Estado Italiano. Por causa das grandes devastações
que este Mosteiro sofreu ao longo dos mais de 1500 (mil e quinhentos) anos de
história, Montecassino pode ser “simbolizado por um carvalho centenário,
quebrado pela tempestade mas sempre tornando ao verde e à vida, mais forte: “succisa virescit”. (“Cortado floresce”). (MONTECASSINO,
2016).
Ao longo
destes 1800 (mil e oitocentos) anos, Montecassino teve vários grandes Abades em
seu governo. No século XI vemos: Abade Teobaldo, Abade Richerius, Abade
Frederico de Lorraine, Abade Desidério etc. Foram eles que restauraram a
importância política e eclesiástica deste Mosteiro. Principalmente o Abade
Desidério que foi o grande reconstrutor da Basílica e do Mosteiro. Desidério
era amigo do Papa Gregório VII, a quem assistiu na batalha pela independência
da Igreja e mais tarde foi o seu sucessor na Cátedra de São Pedro com o nome de
Vitor III. Enfim, todos os seus Rev.mos senhores Abades, verdadeiros sucessores
de Nosso grande Patriarca São Bento, contribuíram deixando seus legados na
história gloriosa da majestosa Arquiabadia de Montecassino.
VÍDEO
O BOMBARDEIO DA ARQUIABADIA DE MONTE CASSINO EM 15 DE FEVEREIRO DE 1944
VÍDEO
A ARQUIABADIA APÓS A RESTAURAÇÃO
REFERÊNCIAS
ABADIA
DE MONTECASSINO – Publicazioni Cassinesi – Montecassino, 2016.
GREGÓRIO MAGNO, São. São Bento: Vida e Milagres / São
Gregório Magno; Dom Gregório Paixão, OSB. Salvador: Edições São Bento, 2002.
Ut In Omnibus Glorificetur Deus (57,9)